03/09 - Helsingborg

Bom, a perna deu conta da missão, ou pelo menos não se desprendeu do resto de meu banhoso corpo durante a corrida.
Graças aos arcanos poderes do ibuprofeno, a dor estava lá, mas abafada, reduzida a um senso de pressão, um comichão, meio como o que restaria ao capitão se lhe fosse suprimida toda a bandidice, a psicopatia, a misantropia e a miliciofilia. Algumas vezes a pisada deu uma rateada, sem maiores consequências, e nos 10 km finais, apesar de não estar sentindo grande dor, as pernas não respondiam mais, os passos foram ficando esquálidos, e as bundas suecas que tanto me motivaram no início da corrida, agora simplesmente passavam por mim, se tornando rapidamente objetos de desejo cada vez mais distantes e inatingíveis.

As bundas, aliás, sempre foram meu artifício Jedi para render mais nas corridas oficiais do que nos treinos solo nos fins de semana. A estratégia é fixar o meu chi em uma bunda aparentemente desfrutável lá na minha frente e então apertar o passo em sua direção, motivado pela fantasia de abalroá-la tão impetuosamente que acabasse a penetrando inteiro, saindo talvez um tanto lambuzado mas feliz pela extremidade frontal, numa gloriosa sodomia maratônica, mas então dar aquela desviadinha da portadora dos motivadores glúteos, porque afinal os tempos não estão para peixe, e então começar tudo de novo com a bunda seguinte. Serve também eleger algum cara lá na frente como meta, mas aí confesso que não fico olhando tanto pras nádegas.
Mas não adianta, brasileiro quando não caga em 2002 caga em 2018, e corre o risco de cagar de novo em 2022. 
Aguardando o início da corrida agendado para às 10:00, vi às 9:30 a largada ser dada, e saí correndo junto. num primeiro momento pensando "puxa, no primeiro mundo eles são tão eficientes e ciosos dos horários que até adiantaram o início da prova!"... Mas já imediatamente duvidando da minha própria suposição, e substituindo-a por "tá na cara que fiz alguma merda". Ao meu redor, apenas pessoas com o escudo da meia maratona no peito. E, de fato, uma hora e tanto depois, já me vi alcançando a chegada da prova. Eu havia saído com o pessoal da meia maratona, e perdido o caminho correto do percurso da maratona cheia, que ainda não estava sendo sinalizado pelos assistentes de rua porque enfim esta só começaria meia hora depois.

Nada me restou então senão fazer duas voltas do percurso da meia maratona mesmo, não sem antes me perder um pouco até conseguir puxar da memória o caminho correto que então, na segunda vez, estava fazendo sozinho. Mais lá na frente, me reencontrei com meus colegas de 42 K, mas deixei de correr em lugares possivelmente interessantes. Nem foi tão indesculpável assim, não chega a ser lastimável passar duas vezes por locais ao qual nunca mais voltarei nesta encarnação. Mas não foi uma maratona redondinha, e fiquei sem contagem de tempo oficial. Pelo relógio de pulso, 4:19 e uns trocados. Se abater disto uns minutos dos 700 metros a mais que corri da chegada até o local da largada para a segunda volta, dá pra estimar que esta foi minha segunda melhor maratona. Ainda longe das gloriosas e inacreditáveis 4 horas da prova de São Paulo de umas semanas atrás, mas ainda assim meu segundo melhor tempo, e com esta perna podre enchendo o saco!

Agora, à noite, com o efeito do anti-inflamatório já esgotado, estou aqui aleijado e entrevado numa cama.
Mas tudo bem, se que 4 horas e pouco de corrida não conseguiram inequivocamente destruir minha coxa, mais uns dias caminhando até a corrida da semana que vem não devem conseguir também.
Ah, os intestinos também não deram sinal de vida durante a corrida. Correr em jejum tem lá seus méritos. Os banheiro-cabine aqui são idênticos aos de SP. Mas o papel higiênico não acaba 10 segundos depois do início da prova, e os coleguinhas sabem que é pra fazer naquele imenso buraco ali no meio, e não no chão ou no assento!!!

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